quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Estranha...

Tragam-me algo que me acorde os sentidos. Um álcool forte. Um impacto súbito.
Um amoníaco. Uma droga. Um berro que se faça ouvir. Mostrem-me algo que faça sentido. Sentidos precisam de sentido. A vida, essa a mim parece um grande nonsense desprovido de sentido pleno. Falta uma palavra-chave ou a última peça do quebra-cabeça. Falta um por que definitivo para todos os comos, quandos, ondes e quens. E quanto mais prossigo menos sentido faço, menos sentido vejo nas coisas, nas pessoas, no tempo. Eu vivo. Mas e daí? Vivo apenas. Vivo com a sensação de faltar algo visceral. Não sou triste nem feliz. Não sou mais nem sou menos. Sem escolhas, cumpro a existência. De tanto existir achei que pudesse alcançar um sentido. Mas não. Nenhum sentido. Passeio entre o moto-contínuo e o fogo fátuo, entre o ufanismo e a hipocrisia. Pior é se ver de fora do “Grande Teatro”. Representasse bem eu, e talvez o papel me trouxesse ao menos um falso sentido. Mas não represento. Pelo menos, não mais. Não fui boa atriz neste estrondoso espetáculo. Fui um fracasso dramatúrgico.

Falaram-me uma vez que o sentido estava no amor. De fato, em todas as vezes que amei de amor, tive a ilusão de ter todos os sentidos exacerbados e de fazer todo o sentido do mundo. Na experiência do amor havia uma espécie de sagração, uma facilidade imensa de saber explicar-me. Eram experiências entorpecentes. Nada ao redor havia mudado. Mas o olhar de quem ama jamais se convence dessas imobilizações. O olhar de quem ama quer ver beleza, generosidade, cor e magia em movimento. Mas, talvez de tanto movimento, amores passam (não deveriam). E a relidade pós-euforia vai constatar, por repetidas vezes, que nada mudou. Ninguém mudou. É alucinógena a condição de quem ama, de um modo geral. Uma extasiante e deliciosa alucinação. Válida seria se não fosse tão entorpecente e se nos impedisse de, logo adiante quando o amor acaba, darmos de cara com a consciência dessa alucinação. E quanto mais consciência menos sentido.

Strauss dizia que "tudo oferece um sentido, senão nada faz sentido". Mas o sentido que tudo oferece, aos meus olhos, é uma tremenda falta de sentido. Uma loucura. Uma inversão. Uma subversão. Um passatempo enquanto a gente espera pelo último de nossos dias.

O que falta mesmo é sentido. Talvez não haja profundezas, talvez não devêssemos colocar tantas expectativas em SER. Ou talvez eu não pertença a este mundo, que parece não ter nada de meu e onde seria uma estranha visita, sentada na ponta do sofá.
É isso...

* Texto - fonte: http://www.quelquechose.net/qq/arquivos/2004_04.html

0 comentários:

Postar um comentário